sexta-feira, 18 de setembro de 2009

CASOS DE ENSINO - O COMPUTADOR E A ESCOLA

Caso 1

A mulher entra no quarto do filho decidida a ter uma conversa séria. De novo, as respostas dele à interpretação do texto na prova sugerem uma grande dificuldade de ler. Dispersão pode ser uma resposta para parte do problema. A extensão do texto pode ser outra, mas nesta ela não vai tocar porque também é professora e não vai lhe dar desculpas para ir mac na escola. Preguiça de ler parece outra forma de lidar com a extensão do texto.
Ele está , de novo, no computador jogando. Levanta os olhos com aquele ar de quem pode jogar e conversar ao mesmo tempo. A mãe lhe pede que interrompa o jogo e ele pede à mãe “só um instante para salvar”, Curiosa, ela olha para a tela e se espanta com o jogo em japonês. Pergunta-lhe como consegue entender o texto para jogar. Ele lhe fala de alguma coisa parecida como uma ‘lógica de jogo” e sobre algumas tentativas com os ícones. Diz ainda que conhece a base da história e que, assim, mesmo em japonês, tudo faz sentido.
Aquela conversa acabou sendo adiada. A mãe-professora não se sentia pronta naquele momento.


Caso 2

Os três pré-adolescentes só pareciam mesmo interessados em discutir a seleção brasileira. Antes e depois do lanche. E a reunião era para fazer um trabalho de Ciências.
A mãe se lembra dos trabalhos em grupo que era solicitada a fazer e da dificuldade para colocar mãos à obra. Decidida a dar uma mãozinha vai até a estante e separa livros que tocam na matéria: o corpo humano. Leva a pilha para o grupo, que agradece e continua conversando. Inclusive aquele que, diante do computador, faz movimentos repetidos com poucas teclas: control c e control v (selecionar e copiar)
Na tela, um texto feito de páginas e páginas copiadas. Ia dizer alguma coisa quando um deles falou que determinada imagem, com boa formatação, “dava uma capa muito maneira”. A imagem era uma atriz nua. A formatação consistia na colocação de tarjas pretas nas partes do corpo que não poderiam aparecer. Uma representação da censura.
Os livros ficaram lá, no canto, como que à espera.


Caso 3

A empregada tem uma filha de cinco anos matriculada em uma instituição pré-escolar pública. Diz que decidiu fazer o sacrifício de pagar uma escola particular, mesmo pequena, para “garantir o futuro dela”. É que lá tem um computador e lhe disseram que ela vai usa-lo. A mãe está muito mais confiante sabendo que a filha vai “aprender computador”.


Caso 4

Tinha um notebook no meio do caminho. Era um modelo recente, equipado com bateria para horas de uso, em qualquer lugar do planeta. Com DVD: nitidez de som e imagem. O objeto mais multimídia disponível no mercado, pelo menos até aquela data. A professora proprietária, nem queria pensa em quanto tempo ele se tornaria obsoleto. Poderia ser antes mesmo da última prestação, mas não fazia o menor sentido pensar nisso justo naquele momento, com todos os olhares cravados na tela de matriz ativa, enquanto o clique-clique do mouse embutido ia velozmente abrindo e fechando janelas, mostrando-escondendo coisas, as mais variadas.
Que tesouros estariam escondidos lá? Só os apocalípticos pensariam nele como uma nova versão da caixa de Pandora. Por outro lado, como pensar nos que pensariam nele como o depositário das respostas para todas as perguntas? Mas afinal, por que pensar nisso em meio a tanto encaminhamento e à impressão de infinitas possibilidades? Ele, o objeto, ali, aberto, ágil e disponível. Pronto para ser usado por aqueles sujeitos.
E em torno do notebook todos se moviam. Para onde?


Casos extraídos do livro Formação de professores, tecnologias e linguagens de autoria de Raquel Goulart Barreto e publicado pela editora Loyola (São Paulo)

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