quinta-feira, 2 de maio de 2013

AULA 2 - Tendência Tradicional - Síntese dos Quatro Primeiros Capítulos do Livro História das Idéias Pedagógicas no Brasil de Demerval Saviani


Apontamentos sobre a História das Ideias Pedagógicas no Brasil:
de 1549 a 1759 (A Educação Jesuítica)

Por: Ivanderson Pereira da Silva


Esse texto apresenta uma resenha de citações dos quatro primeiros capítulos da obra “História das Ideias Pedagógicas no Brasil” de Demerval Saviani. A obra ganhou o Prêmio Jabuti de Literatura científica no ano de 2009 e representa bibliografia obrigatória e cursos de formação de professores.
Segundo o autor, no campo da história da educação, o número de trabalhos de corte analítico (específico) é dominante em relação ao de caráter sintético (geral). Estudos desta natureza tem maior relevância no tocante a aplicações por outros professores.
Este trabalho está para auxiliar o professor em seu trabalho como instrumento de pesquisa e podendo ser aplicado como livro texto nos cursos de história da educação e afins, haja vista ser este um trabalho que se propõe a contemplar toda a banda das idéias pedagógicas que permearam nos caminhos da Educação desde 1549 até os dias atuais.
 O livro dividido em quatro grandes períodos, a história da educação no Brasi e estes respectivamente subdivididos em capítulos com vistas a distinguir diferentes momentos ou nuances das idéias pedagógicas.
Um diferencial deste trabalho é a datação dos acontecimentos que especifica dia mês e ano do mesmo. Reconhecemos que a leitura dessa resenha não é suficiente para compreender a grandiosidade da obra. É muito mais um convite a sua leitura.
Para concepção do livro, “partiu-se da necessidade da compreensão da evolução do pensamento pedagógico brasileiro a partir da identificação, classificação e periodização das principais concepções educacionais” (SAVIANI, 2007, p.1 e 2).
No campo da pedagogia não há trabalho nesta linha, existem produções em áreas outras, e tentativas no campo das idéias pedagógicas por autores como Moacir Gadotti, mas nada tão específico como a obra em tela. Este trabalho resultou de duas publicações anteriores do mesmo autor desta, onde fez a classificação e a periodização das ideias.
Seu objetivo geral é a compreensão crítica do desenvolvimento das idéias pedagógicas do Brasil mediante o exame da evolução das principais concepções educacionais que tiveram (ou têm) vigência na história da educação brasileira. Como objetivo específico e subsidiário, o estudo se propôs a testar uma classificação e periodização das idéias pedagógicas. (p. 2 e 3).
As fontes de pesquisa foram apreciadas com um olhar analítico-sintético e foi feita uma articulação do singular e do universal. Outro princípio norteador foi o da atualidade da pesquisa, haja que o presente de enraíza no passado e se projeta no futuro.

1. Questões teóricas relativas ao conceito de história das idéias pedagógicas e à perspectiva de análise

É necessário fazer distinção entre história das idéias pedagógicas de história das idéias dos pedagogos. Idéias educacionais e Idéias pedagógicas, idéias pedagógicas e prática educativa (p. 6 e 7). Não são a mesma coisa!
O primeiro período é remetido as ideias pedagógicas dos jesuítas no período colonial como a articulação das práticas educativas dos mesmos nas condições de um Brasil que se incorporava ao império português, sobrevindo  a catequese, a colonização e a educação. As formas do plano educacional do Padro Manoel da Nóbrega como o uso da língua tupi, do teatro e do canto no processo educativo com vistas a enquadrar a colônia no Ratio Stuidiorum.
Uma grande dificuldade encontrada no estudo dessas ideias é a quebra dos paradigmas da visão tradicional. Isso foi possível com uma abordagem de longa duração, mas nem por isso deixou-se de abordar aspectos de média e curta duração.
Esta obra foi baseada no trabalho de Antônio Gramsci que evoca conceitos como movimentos orgânicos (permanentes) e movimentos conjunturais (ocasionais, imediatos, acidentais).

2. A questão da periodização na história das idéias pedagógicas no Brasil

a)      A periodização como problema

Periodizar a história é campo teórico e demasiado subjetivo, pois parte da perspectiva teórica do historiador. Mais comumente encontramos periodizações orientadas pelo parâmetro político.

b)     Periodização preliminar das idéias pedagógicas no Brasil

O trabalho foi dividido em oito períodos e articulado em três níveis de análise, o da filosofia da educação, da teoria da educação e da prática pedagógica, são elas:

1° Período (1549 – 1759): Monopólio da vertente religiosa da pedagogia tradicional
2° Período (1759 – 1932): Coexistência entre as vertentes religiosas e leiga da pedagogia tradicional;
3° Período (1932 – 1947): Equilíbrio entre a pedagogia tradicional e a pedagogia nova
4° Período (1947 – 1961): Predomínio da influência da pedagogia nova
5° Período (1961 – 1969): Crise da pedagogia nova e articulação da pedagogia tecnicista
6° Período (1969 – 1980): Predomínio da pedagogia tecnicista, manifestações da concepção analítica de filosofia da educação e concomitante desenvolvimento da concepção crítico-reprodutivista;
7° Período (1980 – 1991): Emergência da pedagogia histórico-crítica e propostas alternativas;
8° Período (1991 – 1996): Neoconstrutivismo, neotecnicismo, neoescolanovismo. Que rumo tomarão as idéias pedagógicas no Brasil?

Marcos divisórios

1549 – Chegada dos Jesuítas no Brasil
1759 – Expulsão do jesuítas pelo Marquês de Pombal
1932 - Divulgações do “Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova”
1947 – Elaboração do anteprojeto da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB)
1961 – Promulgada a 1ª  LDB
1969 – Entra em vigor a Lei n° 5.540 (reforma universitária) regulamentada pelo Decreto n° 464 de 11 de fevereiro de 1969 e aprovação do parecer 252/69, que introduziu das habilitações técnicas no curso de pedagogia.
1980 – Realização da I Conferência Brasileira de Educação (CBE)
1991 – Realização a sexta (e última) CBE
1996 – Realização do I Congresso Nacional de Educação (CONED) e Promulgada a segunda LDB.


Esta foi a primeira etapa deste projeto e teve duração de dois anos (1996 – 1998) que foram dedicados à esta periodização preliminar.

c)      Uma nova periodização das idéias pedagógicas no Brasil

Uma segunda etapa desta pesquisa se desenvolveu entre agosto de 1998 e julho de 2000:

1° Período (1949 – 1759): Monopólio da vertente religiosa da pedagogia tradicional
Subdividido nas seguintes fases:
1ª fase:Uma pedagogia brasílica ou período heróico;  tentativa de  implantação do plano formulado pelo Padre Manoel da Nóbrega (1549 – 1599)
2ª fase: A institucionalização da pedagogia jesuítica;  data com seu início a promulgação do Ratio Studiorum, o Plano Geral dos Estudos da Companhia de Jesus e passou a ser adotado por todos os colégios jesuíticos independente dos locais onde estavam. (1599 – 1759)

2° Período (1759 – 1932): Coexistência entre as vertentes religiosa e leiga da pedagogia tradicional
Subdividido nas seguintes fases:
1ª  fase: A pedagogia pombalina ou as idéias pedagógicas do despotismo esclarecido; se inicial com a pedagogia pombalina que tem continuidade com o governo de D João VI (1759 – 1827)
2ª fase: Desenvolvimento da pedagogia leiga: ecletismo, liberalismo e positivismo; inicia-se quando é promulgada a lei que institui a escola de primeiras letras (1827 – 1932).

Os outros seis períodos foram reduzidos em dois grandes períodos caracterizados :

3° Período (1932 – 1969): Predominância da pedagogia nova
Subdividido nas seguintes fases:
1ª fase: Equilíbrio entre a pedagogia tradicional e a pedagogia nova (1932 – 1947);
2ª fase: Predomínio da influência da pedagogia nova (1947 – 1961);
3ª fase: Crise da pedagogia nova e articulação da pedagogia tecnicista (1961 – 1969).

4° Período (1969 – 2001): Configuração da concepção pedagógica produtivista
Subdividido nas seguintes fases:
1ª fase: Predomínio da pedagogia tecnicista, manifestações da concepção analítica de filosofia da educação e concomitante desenvolvimento da visão crítico-reprodutivista (1969 – 1980)
2ª fase: Ensaios contra-hegmônicos pedagogias da “educação popular”, pedagogias da prática, pedagogias crítico-social dos conteúdos e pedagogia histórico-crítica (1980 – 1991);
3ª fase: O neoprodutivismo e suas variantes: neo-escolanovismo, neoconstrutivismo e neotecnicismo (1991 – 2001).

Considera-se o período que compreende a saída da ditadura militar até a promulgação da 2ª LDB um período de confronto entre pedagogias críticas e a pedagogia do capital humano, então dominante (1969 – 1996).
Onde o 1° período corresponde ao predomínio da concepção tradicional religiosa, o 2° corresponde a predominância da visão tradicional leiga o 3° refere-se a concepção moderna e o 4° emerge a visão crítica que se expressa fundamentalmente nas concepções dialética (histórico-crítica) e crítico-reprodutivisa em contraposição à concepção produtivista cuja expressão mais característica pode ser encontrada na teoria do capital humano.

3. Primeiro Período; As idéias pedagógicas no Brasil entre 1549 e 1759: monopólio da vertente religiosa da pedagogia tradicional

3.1. Colonização e Educação

As tentativas de colonização do novo território nas primeiras décadas do século XVI sofreram vários revezes, sendo então por determinação do rei Dom João III designada uma delegação contendo quatro padres e dois irmãos, Tomé de Souza (O primeiro Governador do Brasil) o padre Manoel da Nóbrega com a missão de converter os gentios (íncolas) à santa fé católica. A chegada desta delegação deu-se no ano de 1549.
Etimologicamente falando colo pode significar, cultivar, morar, cuidar de, querer bem a, proteger, realizar, honrar, venerar. A palavra colonização, colônia, colono e suas variantes neste texto têm duplo significado, o cultivo da terra e ao trabalho de formação humana. Essa manifestação preliminar de educação desencadeou um processo de aculturação instaurada no âmbito do processo de colonização.
A inserção do Brasil no chamado mundo ocidental deu-se, assim, por meio de um processo envolvendo três aspectos intimamente articulados entre si: a colonização, a educação e a catequese. A emergência da educação como um fenômeno de aculturação tinha na catequese a sua idéia-força, o que fica claramente formulado no Regimento de Dom João III estatuído em 1549 e que continha as diretrizes a serem seguidas e implementadas na colônia brasileira pelo primeiro governo geral.             

3.2. Uma pedagogia brasílica (1549 – 1599)

Quando Pedro Álvares Cabral desembarcou nas terras que mais adiante seriam chamadas de Brasil, encontrou nelas populações com hábitos e costumes, tradições e religiosidade próprias, sobrevivendo da caça, pesca, coleta de frutos e sementes, com algumas plantações, dentre as quais se destacava o plantio da mandioca, onde os indivíduos eram livres. Tratava-se, em suma, de uma economia natural e de subsistência (SAVIANI, 2007, p.33), Nas palavras de Fernandes (1989, p. 76) citado por  Saviani (2007, p.33), natural porque seriam eles capazes de satisfazer às suas necessidades , do grupo social, sem nenhuma troca; e de subsistência porque estava orientada no sentido de satisfazer às necessidades restritas do grupo local.
Um exemplo de organização social que alicerçava as bases da Educação Indígena antes de Cabral está representada no texto através dos Tupinambás, os indivíduos desta tribo eram educados segundo seu sexo e idade, os Peitan eram os recém nascidos, até darem os primeiros passos, a partir daí os meninos até os 7-8 anos receberiam a denominação de Kunumy-miry e as meninas respectivamente Kugnatin-miry, dos 8 aos 15 anos os meninos seriam Kunumy e as garotas Kugatin, os rapazes entre 15 e 25 anos eram Kunumy-uaçu e as moças nesta faixa etária as Kugnammuçu, na fase adulta entre os 25 e os 40 anos, Aua seriam aos homens solteiros,os casados eram os Mendar-amo; as mulheres solteiras eram as Kugnam e as casadas as Kugnammuçupoare e finalmente Thuyuae, homens de idade superior a 40 anos e Uainuy, mulheres com idade superior a 40 anos.
Até os 7-8 anos todas as crianças dependiam estritamente da mãe, os meninos eram incentivados ao uso do arco e flecha, a imitação de pássaros e outros folguedos e as meninas se dedicavam aos jogos infantis, a fiação de algodão e a amassar o barro para fabricação de utensílios domésticos de cerâmica como potes e panelas (idem p.36).
Quando os meninos entravam na fase de Kunumy passavam a acompanhar o pai, este deveria toma-lo como modelo, preparando-se para a vida de adulto. Já as meninas passariam a depender ainda mais da mãe, seria esta sua mestra e modelo iriam agora ser ensinadas atividades de horticultura, fiação do algodão e tecelagem, a fazer farinhas e vinhos, cozinhar e preparar alimentos.
Na faixa etária seguinte, dos 15 aos 25 anos, era a fase de participação mais ativa nas atividades dos adultos, incluídas as cerimônias de iniciação após as quais “as jovens podiam entreter aventuras amorosas e contrair matrimônio”. Nesse período os rapazes se envolveriam ativamente em atividades como caça, pesca, participando de expedições guerreiras, fabricação de flechas e prestando serviços nas reuniões dos velhos; as moças continuariam em seus afazeres domésticos auxiliando as famílias nas atividades femininas.
Entre os 25 e 40 anos os homens passavam a participar plenamente da vida dos adultos, sendo admitidos nos bandos guerreiros, a participação nas reuniões com os velhos dava-lhes acesso à memória da sociedade tupinambá, associando novos conhecimentos sobre suas tradições e instituições. As mulheres dessa mesma faixa também assumiriam a função de adultas, ocupando as numerosas e cansativas ocupações domésticas como coleta de frutos, mariscos e ovos e o cultivo das plantas, cuidando diretamente da educação dos filhos, nesta idade a elas era dado o direito de participar de várias cerimônias em conjunto com os homens.
A partir dos 40 anos os homens poderiam se tornar chefes e líderes guerreiros e chegar à condição de pajés, sua conduta agora serviria de exemplo para os mais novos. Eram admirados e respeitados por todos da tribo; as mulheres desta idade iriam agora presidir o conjunto dos trabalhos domésticos, carpindo os mortos e servindo de mestras para a iniciação das moças na vida feminina.
Nota-se que a cultura era transmitida oralmente, e como acima referido a educação se apoiava basicamente em três elementos: a força da tradição, a força da ação e a força do exemplo.
Pode-se considerar que os primeiros evangelizadores do Brasil foi um grupo de 8 franciscanos que chegaram com Pedro Álvares Cabral em 1500. entre 1503 e 1516 chegaram mais dois frades da mesma ordem, em 1534 mais um grupo chega com Martim Afonso de Souza, em 1537 chegam ao brasil mais 5 franciscanos espanhóis, o estabelecimento definitivo da Ordem no Brasil data de 1585 quando foi fundada em Olinda a 1ª Custódia do Brasil com o Convento de Nossa Senhora das Neves de Olinda.
Uma outra ordem que se fixou no Brasil no século XVI foi a dos beneditinos que se estabeleceram no Brasil em 1581, em Salvador, com a finalidade de ali construir um mosteiro, outros foram fundados em Olinda, rio de Janeiro, Paraíba do Norte e São Paulo.
Outras ordens que estiveram presentes no processo de colonização do Brasil foram os carmelitas, mercedários, oratorianos e capuchinhos, tendo desenvolvido alguma atividade educativa. Todas essas foram dispersas em seus objetivos educacionais, não tiveram proteção oficial e poucos recursos. Diferentemente os Jesuítas vieram por determinação da realeza, que exerceram  forte influência no que tange à educação no brasil nesse período, configurando um esboço de um sistema educacional sistema esse que se consolidaria com o Ratio Studiorum.
A primeira fase da educação jesuítica foi marcada pelo plano de instrução elaborado por Nóbrega. O plano iniciava-se com o aprendizado do português (para os indígenas); prosseguia com a doutrina cristã, a escola de ler e escrever e, opcionalmente, canto ofeônico e música instrumental; e culminava, de um lado, com o aprendizado profissional e agrícola, e de outro lado, com a gramática latina para aqueles que se destinavam à realização de estudos superiores na Europa (Universidade de Coimbra). Esse plano não deixava de conter uma preocupação realista , procurando levar em conta as condições específicas da colônia.
Contudo sua aplicação foi precária, tendo cedo encontrado oposição no interior da própria Ordem jesuítica, sendo finalmente suplantado pelo plano geral de estudos organizado pela companhia de Jesus e consubstanciado pelo Ratio Studiorum. O plano de Nóbrega incluía também um “projeto de educação para o sexo feminino” que não deu certo.A principal estratégia utilizada para a organização do ensino, tendo em vista o objetivo de atrair os “gentios”, foi agir sobre as crianças. Para isso se mandou vir de Lisboa meninos órfãos, para os quais foi fundado o Colégio dos meninos de Jesus da Bahia e, depois, o Colégio dos Meninos de Jesus de São Vicente. Pretendia-se pela mediação dos meninos brancos, atrair os meninos índios, e por meio deles, agir sobre seus pais, em especial os caciques, convertendo toda a tribo para fé católica. A sujeição dos índios pela coação foi condição sine qua non para o processo de conversão à fé católica.
Anchieta aprendeu a língua tupi e dela se utilizou para realizar o trabalho pedagógico, fez assim um agente de “civilização pela palavra”. Entre 1564 e 1598, Anchieta escreveu aproximadamente vinte autos, o que corresponde à quase a totalidade das peças jesuíticas do período (Bittar e Ferreira Jr, 2002, p.8), nesses autos predomina a luta do bem contra o mal.

3.3. A institucionalização da pedagogia jesuítica ou o Ratio Studiorum (1599 – 1759)

Em 1564 a Coria portuguesa adotou o plano da redízima, pelo qual dez por cento de todos os impostos arrecadados da colônia brasileira passaram a ser destinados à manutenção dos colégios jesuíticos. (p.49)
Em todos esses aspectos ressalta o contraste entre as dificuldades e privações enfrentadas na primeira fase e as facilidades e conforto usufruídos na segunda.
Coincidindo com essa fase de prosperidade da missão jesuítica no Brasil, a companhia de Jesus deu início à elaboração de um plano geral de estudo a ser implantado em todos os colégios da Ordem em todo mundo, o Ratio Studiorum. (p. 50).
Dois métodos de ensino foram os pilares para a estruturação do Rário Studiorum: o modus itálicus e o modus parisienses.
Modus parisiensis, considerado o melhor “em matéria de repetições, disputas, competições, interrogações e declamações” (Franca, 1952, P. 8) para o aprendizado da gramática da língua latina. (p. 50)
Ratio Studiorum que foi enviado de Roma para as instituições que iam fundadas nos diversos países visando a uniformizar a organização e o funcionamento dos colégios. (p. 50).
Modus itálicus, caracterizava-se por não seguir um programa estruturado e nem vincular a assistência dos discípulos a determinada disciplina. Esses podiam passar de uma a outra disciplina sem necessidade de preencher qualquer tipo de pré-requisito.
Basicamente esse método implicava a presença de um preceptor que ministrava instrução a um conjunto de discípulos que eram reunidos independentemente das eventuais diferenças de níveis de formação e das idades de cada um. No entanto, já que as diferenças existiam, lançava-se mão de estudantes mais adiantados ou de instrutores para acompanhar os discípulos em fase de iniciação. (p. 52).
A partir do início do século XVI, o modus itálicus foi sendo progressivamente suplantado pelo modus parisiensis. A data de referência é 1509, quando o Colégio de Mantaigu, de Paris, introduziu a divisão dos alunos em classes. Diferentemente do modus itálicus, o modus parisiensis de ensinar comportava, como aspectos básicos, a distribuição dos alunos em classes, realização, pelos alunos, de exercícios escolares e mecanismos de incentivo ao trabalho escolar.
A organização das classes dava-se pela reunião de alunos aproximadamente da mesma idade e com o mesmo nível de instrução aos quais se ministrava um programa previamente fixado composto por um conjunto de conhecimentos proporcionais ao nível dos alunos, sendo cada classe regida por um professor.
Os exercícios escolares tinham como objetivo mobilizar, no processo de aprendizagem, as faculdades dos alunos. Baseando-se na escolástica, o modus parisiensis tinha como pilares a lectio, isto é, a preleção dos assuntos que deviam ser estudados, o que podia ser feito literalmente por meio de leitura; a disputatio, que se destinava ao exame das questiones suscitadas pela lectio; e as repetitiones, nas quais os alunos, geralmente em pequenos grupos, repetiam as lições explanadas pelo professor diante dele ou de um aluno mais adiantado. Os mecanismos de incentivo ao estudo implicavam castigos corporais e prêmios, louvores e condecorações, além da prática da denúncia ou delação.
Tendo assimilado o modus parisiensis ao estudarem na Universidade de Paris, os jesuítas o adotaram desde o primeiro colégio fundado em Messina em 1548 e o consagraram no Ratio Studiorum, que regulou o funcionamento de todas as suas instituições educativas. (p. 52).
A primeira versão do Ratio foi fruto de uma comissão instituída em 1584 pelo padre Cláudio Aquativa, eleito geral da Ordem em 1581. dos trabalhos da comissão surgiu, em 1585, um texto que, submetido à apreciação de Aquativa, foi editado em 1586 para uso interno e enviado a todos os provinciais. Essa versão não se destinava a ser posta em prática, mas apenas à apreciação e crítica das autoridades responsáveis pelos melhores colégios da Companhia. Após colocado o texto na forma de normas organizadas por notáveis da universidade de Roma, chegou-se à versão definitiva do Ratio publicada em 1599.
O código representado pelo Ratio atque Institutio Studiorum Societatis Jesu contém 467 regras. Com as sugestões das várias províncias chegou-se, em 1591, à segunda versão, que posta em prática em caráter experimental por três anos, resultou na terceira versão, editada e promulgada em janeiro de 1599 para vigorar em todos os colégios da Companhia de Jesus (p. 55).
O plano foi constituído por um conjunto de regras cobrindo todas as atividades dos agentes diretamente ligados ao ensino. Começava pelas regras do provincial, passava pelas do reitor, do prefeito de estudos, dos professores de modo geral e de cada matéria de ensino, chegava às regras da prova escrita, da distribuição de prêmios, do bedel, dos alunos e concluía com as regras das diversas academias. O prefeito de estudos tinha função supervisora.
O plano contido no Ratio era de caráter universalista e elitista. Universalista porque se tratava de um plano adotado indistintamente por todos os jesuítas, qualquer que fosse o lugar onde estivessem.elitista porque acabou destinando-se aos filhos dos colonos e excluindo os indígenas.
O novo plano começava com o curso de humanidades, denominado no Ratio de “estudos inferiores”, correspondentes ao atual curso de nível médio. Seu currículo abrangia cinco classes ou disciplinas: retórica, humanidades, gramática superior, gramática média e gramática inferior. A formação prosseguia com os cursos de filosofia e teologia, chamados de “estudos superiores”.
O currículo filosófico era previsto para a duração de três anos, com as seguintes classes ou disciplinas: 1° ano: lógica e introdução às ciências; 2° ano: cosmologia, psicologia, física e matemática; 3° ano: psicologia, metafísica e filosofia moral. O currículo teológico tinha a duração de quatro anos, estudando-se teologia escolástica ao longo dos quatro anos; teologia moral durante dois anos; Sagrada Escritura também por dois anos; e língua hebraica durante um ano.
Estudos inferiores, que tinha a duração de seis a sete anos e cujo conteúdo reeditava o Trivium da Idade Média, isto é, a gramática (quatro a cinco séries); esta, por sua vez, dividia-se em gramática inferior, média e superior, sendo que cada uma das duas primeiras podia subdividir-se em duas (inferior A e B e média A e B); a gramática era ensinada com o objetivo de assegurar expressão clara e precisa. A dialética, chamada no Ratio de humanidades (uma série), destinava-se a assegurar expressão rica e elegante.
E a retórica (uma série) buscava garantir uma expressão poderosa e convincente. No conteúdo trabalhado nesse curso o latim e o grego constituíam as disciplinas dominantes. A elas subordinavam-se a língua vernácula, a história e a geografia, ensinadas na leitura, versão e comentários dos autores clássicos. (p. 59)
As idéias pedagógicas expressas no Ratio correspondem ao que passou a ser conhecido na modernidade como pedagogia tradicional. Essa concepção pedagógica caracteriza-se por uma visão essencialista de homem, isto é, o home é concebido como constituído por uma essência universal e imutável. À educação cumpre moldar a existência particular e real de cada educando à essência universal e ideal que o define enquanto ser humano.
Para a vertente religiosa, tendo sido o homem feito por Deus à sua imagem e semelhança, a essência humana é considerada, pois, criação divina. Em conseqüência, o homem deve empenhar-se em atingir a perfeição humana na vida natural para fazer por merecer a dádiva da vida sobrenatural.(p. 58).
Os jesuítas podiam lançar mão dos clássicos da Antiguidade para promover a instrução cristã, em lugar da literatura que lhe era contemporânea, já que esta se encontrava impregnada de anticatolicismo, a “pedagogia ativa” por eles propugnada constituía uma verdadeira revolução. (p.59)

4. A “máquina mercante” e as metamorfoses na educação

Destacam se no século XVII duas figuras no campo intelectual brasileiro: Gregório de Matos e Antônio Vieira, ambos jesuítas. Enquanto Matos prende-se ao passado, amarrado por costumes tradicionais, Vieira é visionário e percebe que a maquina marcante vem para ficar.
Aconselha D. João VI a fundar uma companhia das Índias Ocidentais a exemplo da Inglaterra e Holanda contraditoriamente, finca pé junto aos jesuítas nos combates de interesse da coroa. Confrontado por Antonil, trazido da Itália pelo próprio Vieira, considerado o primeiro economista do Brasil, Antonil integra-se totalmente ao mercantilismo colonial.
A tomada de posição de Antonil junto a Jorge Benci em favor de sujeitar os índios ao trabalho escravo, entrou em rota de colisão com Vieira que se opunha a escravização dos índios, embora essa não fosse a realidade para os negros. Jorge Benci teorizará sobre a suavização do fardo dos escravos e desenvolverá uma pedagogia especifica para a educação dos escravos.
Revelando-se exímios economistas, os jesuítas constituíram um grande tesouro, isentos de impostos, proprietários de grandes latifúndios, gado, escravos, estavam atentos as oscilações das cotações do açúcar, buscando redirecionar a produção para outros produtos agrícolas e aplicando as receitas na compra de propriedades para arrendamento.
A concorrência com os empreendedores era desleal e vantajosa despertando a indignação e revolta. Ao quadro econômico descrito juntou-se a questão política das terras missioneiras, quando as coroas de Espanha e Portugal se voltaram conjuntamente contra os jesuítas. (tratado de Madri). O cumprimento do tratado esbarrou na resistência de cerca de 100 mil índios cristianizados vencidos pela força das armas.
As alegações contra os jesuítas vieram do governador do estado do Grão-Pará e Maranhão Francisco Xavier de Mendonça Furtado, irmão de Carvalho e Melo, futuro Marques de Pombal e incluíam a desigualdade na cobrança de tributos (enquanto se pagava 80% os religiosos eram isentos), usurpações contra a liberdade dos índios a posse dos bens situados nas terras em que eles moravam, a venda das drogas que, por ordem deles, os índios iam buscar no sertão; e a venda das carnes e couros e dos peixes obtidos com o trabalho dos mesmos índios, a obstinação em suas praticas e ousadamente  recusavam-se a seguir as bulas e ordens papais, assim como as determinações reais que culminou com a expulsão dos jesuítas em 1759.

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